A meta é reduzir a meta: PL do novo Plano Nacional da Educação chega à Câmara dos Deputados

Prevista para vigência entre 2024 e 2034 substituindo o atual PNE, proposta traz metas mais rebaixadas que o plano atual
O governo federal enviou ao Congresso Nacional em 27 de junho, o Projeto de Lei 2614/2024 que trata do Plano Nacional de Educação (PNE) para os próximos dez anos (2024-2034). As diretrizes para a educação brasileira contêm 18 objetivos e 58 metas com as principais políticas, programas e ações envolvendo a União, os estados, o Distrito Federal e os municípios. O novo PNE vai substituir o plano estabelecido para o período atual (2014-2024), que deve ser prorrogado até o próximo ano, conforme prevê o PL 5665/23, aprovado pelo Senado e ainda em análise na Câmara dos Deputados.
Os objetivos compreendem as temáticas de educação infantil, alfabetização, ensino fundamental e médio, educação integral, diversidade e inclusão, educação profissional e tecnológica, educação superior, estrutura e funcionamento da educação básica, tendo como tema central o financiamento público da educação. Uma novidade do PL é o objetivo número 8, que trata das modalidades de educação escolar indígena, educação do campo e educação escolar quilombola. O PL mantém metas para os públicos-alvo da educação especial e educação bilíngue de surdos.
Integrantes do Grupo de Trabalho de Política Educacional do ANDES-SN (GTPE), as coordenadoras Raquel Dias e Clarissa Rodrigues e o coordenador Emerson Duarte, fizeram uma análise prévia do PL e apontam retrocessos e contradições da proposta.
Orçamento da educação pública
A meta 18.a (item do objetivo 18), que trata do financiamento da educação pública, é a mais importante e, como avalia a 1ª vice-presidenta do ANDES-SN, Raquel Dias, “a meta do governo é reduzir a meta”. Ela explica que a meta 18.a prevê a ampliação do investimento público em educação para 7% do PIB até o sexto ano e 10% do PIB até o final da vigência do PNE. Entretanto, o PNE atual prevê que até o quinto ano de vigência – que seria 2019 – essa meta deveria ter sido ampliada para 7% do PIB, o que não aconteceu. “A meta não foi alcançada. Chegamos ao final do PNE e temos uma aplicação de apenas 5% do PIB em educação pública e de 5,5% em educação como um todo. Portanto, colocar como meta “alcançar 7% do PIB até o sexto ano de vigência do PNE proposto” é um retrocesso com relação ao PNE atual, que já prevê esse percentual até o quinto ano”, apontou a dirigente.
O PL também não atende o documento referência aprovado pela Conferência Nacional de Educação (Conae) para a elaboração do novo PNE. Raquel lembra que no relatório há uma previsão de ampliação de 7% do PIB até o quarto ano; de 9% do PIB até o oitavo ano e de 10% do PIB, no mínimo, até o final de vigência do plano. “Portanto, é um recuo do governo com relação ao documento aprovado na Conae. Mais importante do que isso, é lembrar que o PNE de 2001 já previa os 7% e isso foi vetado pelo governo de Fernando Henrique Cardoso. Então há muito tempo estamos perseguindo esses 7%. Se levarmos os 7% para o sexto ano de vigência, serão pelo menos 30 anos perseguindo os 7%”, ressalta.
Raquel lembra ainda que o PNE da sociedade brasileira, aprovado em 1997, já defendia a aplicação imediata de 10% do PIB na educação. “Prorrogar os 10% do PIB, mais uma vez, para daqui a dez anos, significa prorrogar também o futuro de crianças e jovens, da classe trabalhadora e da escola pública”, avalia. Ela lembra que a posição do Sindicato Nacional é explícita: “O ANDES-SN está na luta pela defesa da aplicação imediata de 10% do PIB na educação pública.”
Acesso ao ensino superior
O conteúdo específico do PL 2614/2024 relacionado à educação superior está contido nos objetivos de 13 a 15, relacionados com as metas 12 a 14 do PNE vigente. O primeiro ponto, contido no objetivo 13, trata, entre outras coisas, da ampliação da taxa líquida de acesso ao ensino superior, ou seja, das matrículas de estudantes com idade entre 18 a 24 anos, comparados com a população desta faixa etária, para 40%. O PNE vigente demarcou elevar para 33% a taxa líquida. Contudo, de 2014 a 2022, a taxa líquida avançou de 18% para 20%, muito aquém do que a sinalização apontada no PNE vigente e no PL.
“Essa realidade coloca poucas perspectivas para a juventude que, em ampla maioria, permanece fora da educação superior. E isso ocorre, em larga medida, pela estagnação do crescimento das matrículas na educação superior pública nos últimos dez anos. Portanto, é uma responsabilidade do governo federal e de governos estaduais a necessidade de ampliar os investimentos com a educação superior que possibilite a ampliação do acesso, sem deixar de priorizar a qualidade da permanência”, critica o 2º vice-presidente da Regional Norte II, Emerson Duarte.
Contradições
Para a 2ª vice-presidenta da Regional Leste, Clarissa Rodrigues, sem financiamento para a educação não é possível pensar que as metas propostas pelo novo PNE serão factíveis. “Além disso, as metas são mais tímidas em relação ao plano anterior. Outra questão é que nos dez anos de vigência do PNE atual (2014-2024), somente quatro das 20 metas foram parcialmente cumpridas”, desaprova.
Clarissa reforça também que não há valorização de professoras e professores sem reestruturação de carreira e reposição de salários e alerta para outros problemas constantes na proposta do governo. “Há, ainda, uma contradição com a legislação vigente. A Base Nacional de Formação de Professores, Formação Inicial e Continuada de Professores, homologada recentemente pelo MEC, coloca alguns desafios importantes, como a questão do notório saber e a possibilidade de EAD na reforma do Novo Ensino Médio (NEM)”, afirma.
De acordo com a 2ª vice-presidenta da Regional Leste, não há, nessa discussão, a questão da universalização do ensino médio. “O PL fala em universalização da educação não para o ensino médio, mas para uma faixa de idade de 16 anos. Nós sabemos que grande parte da população na idade escolar está fora dessa faixa, dessa conexão idade-série. Então, colocar que a universalização se dará até os 16 anos, retira o ensino médio como uma meta de universalização”, pondera.
Confira os 18 objetivos que contemplam a proposta do novo PNE:
1 – Ampliar a oferta de matrículas em creche e universalizar a pré-escola;
2 – Garantir a qualidade da oferta de educação infantil;
3 – Assegurar a alfabetização ao final do 2º segundo ano do ensino fundamental para todas as crianças, com inclusão e redução de desigualdades;
4 – Assegurar que crianças, adolescentes e jovens em idade escolar obrigatória concluam o ensino fundamental e o ensino médio na idade regular, em todas as modalidades educacionais, com inclusão e redução de desigualdades;
5 – Garantir a aprendizagem dos estudantes no ensino fundamental e no ensino médio, em todas as modalidades educacionais, com inclusão e redução de desigualdades;
6 – Ampliar a oferta de educação integral em tempo integral para a rede pública;
7 – Promover a educação digital para o uso crítico, reflexivo e ético das tecnologias da informação e da comunicação, para o exercício da cidadania;
8 – Garantir o acesso, a qualidade da oferta e a permanência em todos os níveis, etapas e modalidades na educação escolar indígena, na educação do campo e na educação escolar quilombola;
9 – Garantir o acesso, a oferta de atendimento educacional especializado e a aprendizagem dos estudantes público-alvo da educação especial e dos estudantes público-alvo da educação bilíngue de surdos, em todos os níveis, etapas e modalidades;
10 – Assegurar a alfabetização e ampliar a conclusão da educação básica para todos os jovens, adultos e idosos;
11 – Ampliar o acesso e a permanência na educação profissional e tecnológica, com inclusão e redução de desigualdades;
12 – Garantir a qualidade e a adequação da formação às demandas da sociedade, do mundo do trabalho e das diversidades de populações e seus territórios na educação profissional e tecnológica;
13 – Ampliar o acesso, a permanência e a conclusão na graduação, com inclusão e redução de desigualdades;
14 – Garantir a qualidade de cursos de graduação e instituições de ensino superior;
15 – Ampliar a formação de mestres e doutores, de forma equitativa e inclusiva, com foco na prospecção e solução dos problemas da sociedade;
16 – Garantir formação e condições de trabalho adequadas aos profissionais da educação básica;
17 – Assegurar a participação social no planejamento e gestão educacional;
18 – Assegurar a qualidade e equidade nas condições de oferta da educação básica.
O novo PNE foi elaborado por um Grupo de Trabalho (GT) formado por representantes do Ministério da Educação e de autarquias vinculadas. A Conae, realizada entre os dias 28 e 30 de janeiro, também debateu a proposta e teve como tema “Plano Nacional de Educação 2024-2034: Política de Estado para garantia da educação como direito humano com justiça social e desenvolvimento socioambiental sustentável”.
Confira o PL 2614/2024.
Foto da Capa: Renato Araujo/Câmara dos Deputados
Fonte: ANDES-SN – Publicado em 02 de Julho de 2024 às 17h55. Atualizado em 03 de Julho de 2024 às 10h02

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