Ato no 43º Congresso destaca luta antirracista, visibilidade trans e defesa dos povos indígenas

Manifestantes fizeram um percurso dentro do campus de Goiabeiras da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) até a Reitoria e depois seguiram para o Teatro Universitário, onde acontecem as plenárias do Congresso

A tarde da quarta-feira (29), no 43º Congresso do ANDES-SN, foi marcada por uma manifestação organizada pelo Coletivo de Negras e Negros do Sindicato Nacional, que trouxe, além da pauta antirracista, a luta pela Visibilidade Trans e pelos direitos das populações indígenas. Com participação do Coletivo LGBTI+ do ANDES-SN, as e os manifestantes reivindicaram uma universidade e uma sociedade livres de racismo e transfobia e com respeito aos povos originários.

Dezenas de manifestantes se concentraram na tenda do Congresso e fizeram um percurso, dentro do campus de Goiabeiras da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), até a Reitoria, onde protestaram contra o racismo nas instituições públicas de ensino superior. A diretora do ANDES-SN, Jacyara Paiva, salientou que as pessoas negras têm trabalho redobrado para desenvolver suas atividades dentro da universidade.

“Nós queremos garantia de que possamos ser como qualquer outro pesquisador ou outra pesquisadora, que não tenha que se preocupar com nada, senão a pesquisa e construir o conhecimento. Mas, infelizmente, quando nós entramos nas nossas universidades, nós descobrimos que nós temos que nos preocupar também com a nossa sobrevivência. Nós vivemos o epistemicídio, nós vivemos o apagamento quando nós ousamos lutar. E eu digo para vocês, ainda que tenhamos vitória, as vitórias não apagam as nossas dores. As vitórias não apagam a violência sofrida. A vitória não fecha as nossas cicatrizes”, afirmou.

A professora lembrou a perseguição que sofreu no final de 2023 e início de 2024, quando ficou sob ameaça de exoneração, o que não se concretizou graças à mobilização do ANDES-SN e suas seções sindicais, em especial a Associação de Docentes da Ufes (Adufes SSind) – onde Jacyara é base – e dos movimentos sociais em torno da campanha #JacyFica, além da atuação jurídica das entidades sindicais. “Eu digo com muita tristeza no coração que esse espaço aqui já foi usado e já foi lotado por pessoas, várias vezes. Especialmente, por conta do racismo. Eu já estive aqui junto com as companheiras e os companheiras de luta porque eu era o alvo”, disse.

Além disso, a diretora do ANDES-SN salientou que a Ufes descumpriu, por nove anos, a Lei 12.990/2014, que prevê cotas raciais para concursos docentes nas universidades. Ela cobrou da instituição a reparação das vagas que não foram ofertadas durante este período e que deixaram de ser ocupadas por docentes negras e negros.

Jacyara Paiva lembrou, ainda, que a Adufes SSind sofre perseguição por conta da greve realizada em 2024. “Eu preciso denunciar também que nós fizemos uma greve aqui e agora o sindicato está sendo cobrado, por meio de boletos, por ações de greve. E nós, docentes dessa universidade, já anunciamos: nós não vamos pagar nada! E o reitor não apareceu na abertura do nosso congresso, demonstrando toda a ‘valorização’ que ele dá à categoria”, acrescentou.

Visibilidade trans
A vice-presidenta da Adufes SSind – seção anfitriã do Congresso – Jeffa Santana também falou durante o ato na Reitoria e chamou a atenção para o fato de a manifestação estar acontecendo no Dia da Visibilidade Trans (29 de janeiro). “Estamos falando de uma população que é a que mais morre no Brasil e que tem os seus direitos retirados de diversas formas. Mais de 20 universidades hoje no Brasil possuem cotas trans para docentes. Dentro dessa universidade [Ufes], desde 2016, tem sido feita essa luta pelas cotas trans. E queremos uma resposta dessa Reitoria”, reivindicou.

Ainda na Reitoria, a diretora de Relações Sindicais da Associação dos Docentes da Universidade Estadual do Mato Grosso do Sul (Aduems SSind), Adma Cristhina Salles de Oliveira, destacou que o espaço da universidade não é privado, mas mantido pelos impostos, defendendo a existência de ouvidoria em todas as universidades, voltada a essa questão.

Carta
A manifestação seguiu para o Teatro Universitário, onde tomou os espaços com cartazes e palavras de ordem para depois lerem coletivamente uma carta do Coletivo de Negras e Negros do ANDES-SN. No documento, o grupo reafirma seu compromisso com a luta antirracista e destaca avanços obtidos dentro do sindicato e da academia, como a mobilização que garantiu a permanência de Jacyara Paiva como docente da Ufes.

O documento também denuncia o descumprimento da Lei 12.990/2014, que estabelece cotas para negras e negros em concursos docentes, e defende a necessidade de reparação por meio da disponibilização das vagas não preenchidas devido aos anos que diversas instituições deixaram de fazer a reserva como manda a legislação. O documento defende, ainda, maior proporcionalidade racial na composição das chapas concorrentes nas eleições internas do Sindicato Nacional.

Ataque aos povos indígenas
A pauta indígena também foi destaque na manifestação. Joselene Mota, diretora-geral da Associação dos Docentes da Universidade Federal do Pará (Adufpa SSind.), falou sobre os ataques do governo de Helder Barbalho (MDB) aos povos indígenas no seu estado. “Estou aqui em nome da comunidade indígena, em nome da educação escolar indígena que hoje sofre um grande ataque do governo de Helder Barbalho que acabou com o Estatuto do Magistério do Pará e a Educação Escolar Indígena. Ele quer substituir professor por televisor. Quer retirar o direito que historicamente foi legado aos povos originários, às etnias indígenas do Pará, para colocar televisores em aldeias, em comunidades tradicionais, ribeirinhas, extrativistas e quilombolas onde não há o mínimo de condições sequer de internet”, contou.

Ela lembrou que a 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP 30) será realizada em Belém, no Pará, em novembro de 2025 e que o governador que recebe o evento é o mesmo que coloca em risco aqueles povos que mais defendem a floresta, que mais defendem a vida.

“Helder Barbalho não quer que os povos indígenas possam fazer a luta. Não quer que os povos indígenas se tornem professores para ocupar esse espaço da universidade. Em nome dessa luta, da resistência e da greve, uma greve grande que está acontecendo no Pará, estamos pedindo apoio, solidariedade e, sobretudo, uma nacionalização e internacionalização da denúncia sobre os ataques à educação paraense. Se não revogar a Lei 10.820/2024, não vai ter COP!”, conclamou, seguida de gritos de “Não vai ter COP, vai ter luta!” vindos das e dos participantes do Congresso.

Direitos para pessoas Trans
Gabrielle Weber Martins, diretora do ANDES-SN e vice-presidenta da Associação dos Docentes da Universidade de São Paulo (Adusp SSind), lembrou do simbolismo do dia 29 de janeiro (Dia da Visibilidade Trans), lembrando que nessa data, há mais de 20 anos, um grupo de travestis chegou ao Congresso Nacional para levar a campanha Travesti e Respeito e foi a partir desse dia que a luta travesti/trans começou a ter alguns primeiros ganhos. “Ganhos como o nosso direito de ir no cartório e reivindicar o nosso nome. Vocês sabem o que é não ter direito ao próprio nome? Conseguimos despatologizar a transgeneridade. E com isso a gente provocou a ira da cis-heteronormatividade branca, racista, transfóbica, LGBTQIAPN+fóbica, que não quer corpos diversos, que não quer que os alicerces que sustentam o patriarcado cis-hétero branco sejam corroídos pelas nossas existências”, destacou.

Gabrielle completou dizendo que os corpos trans mostram que gênero não é destino. “A gente faz o nosso destino. É por isso que temos sido atacadas num projeto genocida e num processo de legalização do genocídio trans. E é aqui que a gente se junta para lutar pelas nossas vidas, pelo nosso direito de existir. E a gente tem muita luta pela frente, a começar pelas cotas trans para concursos de docentes”, disse.

Jeffa Santanna, vice-presidenta da Adufes, acrescentou que a luta se dá junto às traviarcas – travestis que iniciaram a organização política do movimento no estado do Espírito Santo, comparadas às matriarcas da comunidade. A dirigente convocou as e os presentes para entoar o grito do coletivo e foi atendida. “As gays, as bi, as trans e as sapatão, tão tudo organizada pra fazer revolução!”, clamaram, encerrando o ato.

Confira a cobertura fotográffica no Facebook do ANDES-SN

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Fotos: Eline Luz / Imprensa ANDES-SN
Fonte: Publicado em 30 de Janeiro de 2025 às 18h02. Atualizado em 01 de Fevereiro de 2025 às 15h53

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